A verdade muda. E aqui não se trata
de um enunciado sofista, desculpa do relativismo. Trata-se de constatação
histórica. Nunca existiu, nem existirá, uma verdade eterna. As pessoas vão
mudando e, com elas, seus conceitos sobre o que seja verdade também vão sendo
alterados. O mesmo ocorre no efeito coletivo dessas pessoas em sociedade: vão mudando
seus paradigmas, reformulando seus pré-conceitos e definindo a todo instante a
realidade que as cercam. Tudo de acordo com as suas necessidades, impulso ou
desejos. Isso é que se chama de conhecimento.
O
conhecimento é o resultado da apreensão de uma realidade. E a realidade, como
afirmação, é sempre verdadeira. Mas instável. Para que continue real, a verdade
precisa mudar sempre, ou deixa de ser verdade. Por isso, muda para continuar a
existir. Qualquer parâmetro tido hoje como verdadeiro, ou nem sempre foi ou não
continuará sendo. “Tudo passa, tudo sempre passará”.
Mas se a
idéia de verdade muda, como saber se o que se apreendeu da realidade é
verdadeiro? Como garantir a veracidade de um conhecimento? Depende. Depende de
qual verdade estamos falando. Sobre a verdade:
“Distinguiu-se, por vezes, entre as seguintes concepções da
verdade: (1) verdade metafísica (ou ontologógica); (2) verdade lógica (ou
semântica); (3) verdade epistemológica; (4) verdade nominal (ou oracional),
veritas sermonis. (1) equivale à verdade das coisas, ou à realidade como
verdade; (2) expressa a correpondência, ou adequação, do enunciado à coisa ou à
realidade; (3) refere-se à verdade na medida em que é concebida por um
intelecto e formulada, num juízo, por um sujeito cognoscente; (4) é a verdade
como conformidade entre signos. ” (MORA,
2001, p. 701).
Como aqui o que nos interessa é a possibilidade do conhecimento sobre um conhecimento, vamos
pensar o exemplo citado de Aristóteles pela
via da epistemologia:
O homem, em sua condição de ser
racional que pensa, especula, indaga, emite juízo e conclui, é
epistemologicamente o sujeito por excelência da relação estabelecida com o
objeto Deus. É ele quem sai em busca do conhecimento, o que promove um
deslocamento cognitivo para a apreensão da realidade pensada. Com isso, o homem
se apresenta como sujeito e invade, por necessidade, desejo ou impulso, a
esfera de Deus, num processo de captação e interiorização das propriedades
divinas adquiridas durante a invasão. Em seguida, a partir dos elementos
apreendidos do contato com este objeto, o homem cria a imagem mental de Deus. E
essa imagem é construída à sua imagem e semelhança, intuitivamente. Logo,
pode-se afirmar que Deus, enquanto objeto, apenas existe quando indagado pelo
sujeito homem. Da mesma maneira, o sujeito homem só existe quando em relação
com algum objeto. Neste caso, Deus. Daí surge o conhecimento.
Concluído o processo de invasão do
homem ao objeto, a partir da captação das propriedades de Deus e de sua conseqüente
interiorização, o homem poderá afirmar a veracidade de Deus, pois se tornará o
sujeito dessa relação que gerou conhecimento, permitindo a existência de Deus
mediante a representação para ele criada. Não fosse o desejo do homem de
conhecer a Deus, Deus não existiria. Mas
há o desejo, a imagem mental construída coletivamente, o que permite afirmar que sim, Deus existe e
pode ser conhecido, apreendido. Portanto, há veracidade na afirmação de
Aristóteles. Epistemologicamente, Aristóteles parece estar correto.
Veja que não se trata aqui de uma discussão
teológica sobre os termos Deus e Homem, tampouco de qualquer desvio de foco
para questões religiosas. Trata-se, ao contrário, de uma especulação estritamente
epistemológica, procurando utilizar as teorias expostas nas apostilas, em
analogia à questão filosófica proposta por Aristóteles no exercício.
Concluindo, podemos afirmar que a
veracidade é, em linhas gerais, o produto do processo do conhecimento.
Parece-nos claro que o conhecimento adquirido, construído, é sempre verdadeiro,
ao menos para quem o construiu. No entanto, a questão aponta para outro lado:
como se conhece? Será que o que se conhece é a mesma coisa que o outro julga
conhecer? As imagens mentais, sobretudo as quais não se têm acesso à realidade
senão pelo estabelecimento de um acordo imaginário (Deus, felicidade, saudade)
seguem a determinados padrões?
Não sei. Para responder a isso,
precisaríamos estudar sobre a hierarquia na relação entre sujeito e objeto;
pensar a possibilidade de conhecimento intuitivo e empírico, coletivo e
individual, linguagem, razão etc. Ainda não chegamos lá. Mas penso que este
seja o valor da Teoria do Conhecimento: estimular perguntas para respostas que
sabemos nunca definitivas, nunca completas. O conhecimento sobre o conhecimento
se expande na mesma medida em que conhecemos mais. E continuamos a conhecer, a
aprender, a formular proposições, sempre.
Como sabemos que sabemos? Sabemos? É
possível que saibamos? Se sim, ao que se sabe? O que se supõe saber é verídico,
real? Não sei. Me parece que sim. Mas será possível haver tantas verdades dispares
entre os sujeitos tomadores de uma mesma realidade? Ou serão realidades
distintas? Também não sei. São muitas perguntas, talvez infinitas. Por isso penso
que agora, o mais importante, seja
começar a duvidar das certezas. É assim que a filosofia se expressa. É assim
que o conhecimento se teoriza.
REFERÊNCIAS:
Material de apoio CEUCLAR.
MORA, J. F. Dicionário de Filosofia.
4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 733 p.
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