quinta-feira, 5 de maio de 2011

Crítica ao Humanismo e ao antropocentrismo por Rogério de Sousa

Segundo a Enciclopédia Barsa o humanismo foi um “movimento cultural surgido na Europa, durante a Renascença, baseado nos estudos dos autores gregos e romanos, que atribuía importância fundamental ao homem; posteriormente o termo foi adaptado, surgindo um humanismo científico (F.C.S. Schiller), um humanismo cristão (Maritain) e um humanismo marxista (Marx e Engels)[1]”.


Segundo Bernadette Abrão, “é em nome do humanismo que o homem, mesmo temeroso, começa a separar-se da grande ordem do universo, para ser o seu espectador privilegiado. Mais do que isto, ele é o organizador desta ordem[2]

 Para Pedro Netto, “já por seu próprio conceito, constitui o homem elemento fundamental da sociedade. [...] Forçoso [se faz] reconhecer que a sociedade existe para o homem e constitui-se de homens vinculados, unidos, relacionados em busca de um fim comum[3]”.

Para John Friedmann, comentado por Benedicto Silva, o “homem [deve ser colocado] invencível e indestrutível, no centro de um sistema de valores, [o que seria] outra maneira de repetir o velho aforismo de Protágoras: <<O homem é a medida de todas as coisas>>[4].

Para João Mackay, “a única atitude criadora em face da vida é a do homem que se apega a uma idéia ou causa superior, idéia ou causa que lhe absorva todas as energias do cérebro, do coração, dos braços. Que seja um obreiro de alguma forma. Que ponha seu talento a serviço de alguma coisa de importância indiscutível. Que encontre, vale dizer, sua vocação na vida[5]”.

Segundo penso, o homem do humanismo e da renascença não apresentava problema algum para nossa raça, até que amalgamou o prefixo (homem) com o sufixo (centro), dando origem ao monstro do antropocentrismo. Esta centralização de todas as coisas no sujeito homem é de uma ambigüidade e uma ambivalência tão perigosa que nos faz desejar os tempos pré-históricos de volta, quando ainda andávamos com tacape nas mãos para nos defendermos somente dos ataques animais.

Foram os antropocêntricos na história universal que idealizaram o imperialismo como forma de governo. Vamos encontrar na antiguidade um Sargão que imperializa a partir da Assíria, um Nabucodonosor que faz o mesmo a partir da Babilônia, surgem os Ciros Persas, os Alexandres Macedônios, os Césares Romanos, os Napoleões Franceses, os Mussolines Italianos e os Hitleres Austríacos. Homens centrados em si, e que centralizam tudo em si, ao ponto de um Luiz qualquer chegar a dizer: “O Estado sou eu”. Henry Thomas escreveu que “Luiz [XIV] não tinha a mínima simpatia pelo próximo. <<Um rei, pensava ele, não deve sentir piedade; devia governar o povo como um senhor governa os seus escravos>>. Não demonstrava senão desprezo pelos seus vassalos. Tratava-os como animais pertencentes a um mundo inferior[6]”.
É somente na minha pessoa que reside o poder soberano... é somente de mim que meus tribunais recebem a sua existência e a sua autoridade; a plenitude desta autoridade, que eles não exercem senão em meu nome, permanece para sempre em mim, e o seu uso nunca pode ser contra mim voltado[7]

Quem engendrou filosoficamente o antropocentrismo? Dentre todos, o mais conhecido: Niccoló Machiavelli e seu “Príncipe”. Foi ele quem autenticou o antropocentrismo ao escrever que “é necessário a um príncipe, para se manter, que aprenda a ser mau. [...] quando for preciso, o príncipe deve lançar mão da dissimulação e da violência, para resistir e mudar o curso dos acontecimentos[8]”.  Luiz XIV seguiu o maquiavelismo à risca.

“Fingia favorecer o povo quando na realidade o estava oprimindo. Dizia a seus súditos ser ele o único protetor que tinham contra o poder dos banqueiros. Prendeu Fouquet, representante dos interesses bancários, confiscou-lhe os bens e privou-o de toda a comunicação com os homens, encerrando-o na mais inacessível das fortalezas da França. Anunciou então que havia apoderado do dinheiro particular dos banqueiros para o uso geral do público. Está claro que nada disto era verdade. Tinha apenas transferido o dinheiro dos bancos particulares para o seu tesouro privado, a fim de empregá-lo à sua discrição em seu único benefício[9]
 

Não fosse o antropocentrismo conseqüência direta do humanismo, eu seria por Erasmo.

Ele sustentava a convicção liberal humanista de que os argumentos a respeito da doutrina [religiosa] eram de pouco valor, enquanto a exaltação das capacidades humanas naturais dignificava a natureza humana[10]”.

Ele era um humanista cristão convencido, crendo que o melhor caminho para reformar a igreja era pela boa erudição – por um estudo da bíblia em hebraico e grego e por um retorno aos pais antigos da igreja[11]”.  

Ele dá o nome de philosophia Christi (filosofia de Cristo) a proposta da reforma humanista e evangélica. [...] Como o humanismo, a philosophia Christi também propõe uma concepção humanista de Deus, do homem e da relação entre ambos[12]

Aqui encerro com Erasmo e o humanismo. Sigo com Lutero e os Reformadores. Sigo com os teólogos e teocentrismo. Prossigo concebendo o Homem como satélite, não como estrela. Continuo com Kierkgaard e o salto da fé, com Tillich e a coragem de ser. Vejo o homem pelo viés do Evangelho e faço a leitura da antropologia, do socialismo, da psicologia e qualquer outra ciência à luz da vela cristã, não do holofote pagão e secular.


[1] ENCICLOPEDIA Barsa, V. 15, Rio de Janeiro, São Paulo, 1969, p.154 (verbete humanismo)
[2] ABRÃO, Bernadete Siqueira. História da Filosofia. Ed. Nova Cultural. São Paulo. 1999, p.130
[3] NETTO, Pedro Salvetti. Curso de Teoria do Estado. Ed. Saraiva, São Paulo. 1984, p.24
[4] FRIEDMANN, John R. P. Introdução ao Planejamento Democrático. Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 1959, p.XVII
[5] MACKAY, João A. O homem verdadeiro in Antologia da Sabedoria V. 1 Os Grandes Pensadores, Ed. Logos, São Paulo, p.56
[6] THOMAS, Henry e Dana Lee Thomas. Vidas de Estadistas Famosos. São Paulo. Ed. Globo, 1958, p.131
[7] Citação extraída do livro de História, V. 3, Ed. Lê, São Paulo.1989.
[8] ABRÃO, Bernadete Siqueira. História da Filosofia. Ed. Nova Cultural. São Paulo. 1999, p.157
[9] THOMAS, Henry e Dana Lee Thomas. Vidas de Estadistas Famosos. São Paulo. Ed. Globo, 1958, p.131
[10] WRIGHT, R. K. Mc Gregor. A Soberania Banida, Redenção para a cultura pós-moderna. São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 1998, p.27
[11] LANE, Tony. Pensamento Cristão, Dos Primórdios à Idade Média. São Paulo, Ed. Abba, 2007, p.187
[12] ABRÃO, Bernadete Siqueira, op.cit, p. 168

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