domingo, 24 de abril de 2011

TCD Paidéia - Marcos Baracca

Resumo
Uma análise sobre a fragmentação do saber, a falta de uma unidade ético-moral no ensino atual e o momento correspondente concebido há aproximadamente 500 anos a.C: A Sofística e o método Socrático como crítica deste sistema e um paralelo entre a atual sofística.
O papel que a filosofia desempenhou na época e que deveria desempenhar atualmente.
1-      Introdução
            Esta obra é uma crítica perante o atual panorama sócio – cultural em que vivemos, onde a educação tem um papel vital enquanto formadora de cidadãos.
Como material de comparação, utilizei o modelo da Paidéia grega que se formou no período clássico, um modelo que apesar de ter ocorrido há 2.500 anos, e numa proporção menor no que diz respeito a quantidade populacional, é rico em termos de análise, uma vez que um de seus articuladores, foi talvez o personagem mais importante na história do pensamento ocidental, o considerado “pai da filosofia”, Sócrates.
2-      Construção da crítica
            Em primeiro lugar resumirei os encadeamentos históricos daquela época para depois apresentar os fundamentos dos dois sistemas educacionais que abrangeram este período para que a crítica seja edificada de forma coerente.
2.1- Breve Histórico
            Abordarei o final do período arcaico (800 a 600 a.C.), o qual predominava a explicação mítica e o período clássico (500 a 400 a.C.) quando os sofistas, herdeiros do pensamento pré-socrático, começaram o processo de “bombardeamento” ao sistema educacional mítico e aristocrático, derrubando mitos com ideias relativistas e culminando em Sócrates que por sua vez combateu o relativismo Sofístico e norteou o processo educativo com um objetivo ético-moral, uma moral universal e não fruto de convenções.
2.1.1- Período arcaico
Neste período, a educação tinha como referência a narrativa poético-simbólico-pedagógica de Homero e Hesíodo, somente uma elite tinha acesso ao ensino a qual eram também ministradas aulas de música, ginástica e gramática.
Quanto ao aspecto político, era esta mesma minoria (aristocracia) que detinha o poder de decidir sobre os assuntos do estado.
A finalidade não era o ensino prático, mas buscar a excelência do homem no aspecto físico e intelectual (Arete).
2.1.2- Período Clássico - Democracia – mudança de paradigma, do mito ao logos.
Com o advento da democracia, os cidadãos atenienses começaram a ter participação nos grandes assuntos da Polis e..., se todos podiam opinar então todos deveriam ser educados.
O trabalho deixou de ser uma atividade desonrosa, o ócio antes considerado um valor positivo, agora era sinônimo de inutilidade.
A Paidéia aristocrática demonstrou ser um sistema obsoleto, seria necessário entrar em contato com outras áreas do conhecimento para poder acompanhar os vários processos da cidade que eram julgados em praça pública (Agora).
E foi neste contexto que apareceram os sofistas, estrangeiros oriundos da Magna Grécia que dominavam algumas áreas do conhecimento, principalmente a arte da retórica.
2.1.3- Surgimento dos Sofistas
Os sofistas vieram de regiões da Grécia onde havia nascido a filosofia, pensadores herdeiros das tensões entre a imutabilidade do ser (Parmênides) e o constante devir (Heráclito), conforme Chauí: “Heráclito e Zenão inventaram a dialética; Parmênides inventou a lógica; Empédocles inventou a eloquência” (CHAUÍ,2002,p.164).
A Sofística emergiu como um sistema educacional para a urgente formação do cidadão da polis, pois uma vez instaurada a democracia, deveria saber falar e opinar em praça pública.
E assim a educação deixou de ser um privilégio de poucos, mas de todos os cidadãos atenienses.
2.1.4- Sócrates – a razão encarnada
Sócrates, filho de um escultor e de uma parteira aparece nesse contexto a questionar sobre qual conhecimento os sofistas se julgavam detentores, questiona o verdadeiro objetivo da educação, embora ele nunca tenha se declarado um educador.
Retoma o conceito de Arete, questiona o que é virtude e se ela pode ser ensinada.
Seu método era o dialético - indutivo, uma sequência de indagações onde usava recursos da ironia para atingir o conceito último, que sobrevivesse a todas as refutações.
2.2- Análise dos dois sistemas
Basicamente a sofística pode ser resumida em duas palavras: relativismo e técnica, já Sócrates visava o aprimoramento do caráter, dividiu o ser em razão e apetites (desejos), dois mundos não estanques ligados pela vontade sendo a razão e o conhecimento suficientes para o homem “agir bem”.
2.2.1- Fundamentos da Sofística
Costumes, crenças, religião, diferenças raciais, desigualdade sociais,..., tudo era fruto da convenção humana, e se tudo é convenção, tudo pode ser ensinado, inclusive a Arete.
2.2.1.1- Arete Sofistica
A Sofistica era relativista, “O homem é a medida de todas as coisas” (Protágoras), o conceito de justiça variava conforme os mandos e desmandos de quem estivesse no poder, e neste contexto o homem era educado para um fim prático (discursar em praça pública).
2.2.1.2- Unidade de Ensino
Cada sofista era detentor de uma especialidade, as fronteiras tinham se expandido para além da música, ginástica e gramática, agora o cidadão pode aprender medicina, geometria, retórica, mas, embora os sofistas afirmassem que tudo sabiam, eram apenas conhecedores de um fragmento do saber.
2.2.1.3- Sistema de Ensino
Persuasão a qualquer custo
Pregavam que tudo ensinavam, mas não conduziam os alunos à reflexão, a pensar por si mesmos.
2.2.2- Fundamentos do método Socrático
Investigativo, usando a dialética (em contraponto ao combate verbal dos sofistas) como ferramenta para conceituar as coisas, até chegar em sua última definição, a verdadeira essência, a que sobrevive a todas as indagações.
A verdade é una, e não está na natureza, e sim dentro de cada um, com o método indutivo, Sócrates extraia a verdade daquele com quem dialogava (maiêutica).
Segundo Aristóteles “Sócrates é o criador do método de investigação científica” (CHAUÍ, 2002, p184).
Sua preocupação é ética, torna a ciência uma serva da moral.
2.2.3- Crítica de Sócrates aos sofistas, Paralelo: Paideia – Mito da caverna
Utilizando o mito da caverna Platônico:
O mundo sensível, das sombras, da opinião (doxa), era o dos Sofistas, onde sua ciência era baseada nas aparências, naquilo que os sentidos forneciam como informação.
O mundo inteligível, da luz, da razão (logos), do bem supremo era a busca de Sócrates, todas as virtudes eram a mesma substância: a luz que se encontrava fora da caverna.
2.3- Paralelo: Paideia Clássica – Época atual
Prevaleceu a fragmentação do saber, a Arete ficou deformada, obscura, prática e relativista. Estuda-se para dominar um ramo do saber e ser parte integrante do mercado de trabalho.
A filosofia, que há 2.500 anos, impulsionou a mudança de paradigma do mito ao logos, da opinião à ciência, foi apartada de todas as disciplinas, tornando-se mais uma delas.
Se outrora foi ordenadora e unificadora do saber agora se encontra impotente e isolada numa ilha.
As especializações foram necessárias, e torna-se impossível cogitar uma unificação de todas as ciências, mas pode-se atrelar a filosofia à cada especialidade, pode-se aprender música filosoficamente, engenharia, química, física, fazendo com que a filosofia, unida a estas ciências, imprima seu conteúdo ético - moral, fazendo com que o homem seja o verdadeiro cidadão da atual polis, habilitado não só a desempenhar sua função a qual é especialista, mas a pensar de forma global, a questionar e repensar sua importância na sociedade, quais potenciais é realmente detentor, dando sua contribuição a Polis de uma maneira mais consistente e consciente.
3-      Conclusão
Observando o curto período histórico analisado anteriormente, podemos concluir que a educação, enquanto não possuir um fim maior, torna-se um sistema de disciplinas espalhadas, as quais levam o homem rumo ao domínio técnico, ao vazio e a aridez do mecanicismo.
Qual a melhor opção? Ser virtuoso ou técnico?
Sócrates provou reflexivamente que a busca da virtude é a chave para viver em harmonia consigo mesmo e com a sociedade.
A razão comanda e regula os desejos através da vontade (temperança).
Apesar do avanço da ciência, a sociedade atual está demonstrando-se irracional, provando empiricamente até aonde o domínio da técnica apartada da ética nos leva: um mundo baseado no consumismo, na satisfação desregrada dos desejos, na exploração desordenada e egoísta das riquezas naturais do planeta, ameaçando a própria sobrevivência.
Sem ferramentas nem estímulos para o autoconhecimento o cidadão atual atira-se ao reino da doxa, julga o mundo conforme a estreiteza de seus sentidos vive mergulhado no senso comum.
A educação, como formadora de cidadãos das atuais polis, agora Metro polis, tem sua parcela de culpa neste processo degenerativo da sociedade.
A filosofia que sobreviveu é a filosofia de bolso, livros de autoajuda - uma filosofia barata, uma síntese genérica encontrada em bancas de jornal, uma receita de bolo que guia o homem a uma meta menor, uma Arete esquálida, aquém da qual o ser deveria almejar.
Se a sofística foi a solução de emergência na democracia grega a reativação da filosofia como parte vital de qualquer ramo do conhecimento é urgente na atualidade.
Finalizo aqui minha análise crítica sem nenhuma pretensão de oferecer soluções definitivas mas apenas de sinalizar uma deformidade no processo educacional detectada pelo olhar da filosofia, uma filosofia maior, que pode ser utilizada para a correção deste mesmo processo.

4-      Referências
CHAUÍ, M. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002/2011.
JAEGER, W. Paidéia: a formação do homem grego. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
PLATÃO. A república: vol.1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1965.
CLARETIANO. Paidéia: Tópicos de Filosofia e educação. Caderno de referencia de conteúdo. Un1, 2 e 3. Batatais, 2011.

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