quarta-feira, 20 de abril de 2011

Do Mito ao Logos - Natachy Petrini

DO MITO AO LOGOS - 03/03/11.

Ao iniciarmos os questionamentos acerca da influência da quebra do paradigma entre mitos e logos para o ocidente, nos deparamos com a necessidade de realizarmos uma releitura do processo histórico que ocasionou esta mudança de concepção de mundo, para só depois abordarmos os reflexos em nossa sociedade atual.

Por volta do século XII a.C., no chamado período pré-homérico, o ataque dos dórios às regiões ocupadas pelos aqueus ocasionou na migração forçada dos miscênicos à Ásia Menor, onde fundaram colônias e posteriormente tornaram-se potências marítimas, com a economia voltada ao comércio e artesanato.

A mudança da forma de subsistência dos aqueus (agrária e patriarcal) para a expansão no comércio, fez com que eles tivessem intenso contato com outros povos através da navegação, comercializando seus produtos (artesanato), o que permitiu o intercâmbio cultural com os povos vizinhos.

No livro Introdução à História da Filosofia: Dos Pré-Socráticos a Aristóteles, a professora Marilena Chauí comenta brevemente este período, fazendo citação ao filósofo alemão Wilhelm Windelband:

"De um lado, diz ele, a opulência e o poderio dos comerciantes tiraram o poder das mãos da aristocracia agrária, mas os levaram a compensar a falta de sangue nobre com o aumento de seu próprio prestígio, patrocinando as artes, construindo bibliotecas e promovendo a vida intelectual; de outro, aristocratas descontentes, como Heráclito de Éfeso, retiraram-se da vida pública e passaram a dedicar-se à vida contemplativa. Assim, "a mudança de situação favoreceu, de modos variados e opostos, o desenvolvimento e a difusão dos interesses intelectuais, o que só foi possível, evidentemente, porque esse povo, mais do que qualquer outro, estava impulsionado pelo amor à ciência e à arte" (Windelband, 1955, p. 26)."

Contudo, este novo cenário não foi o único responsável pela transposição do paradigma da visão mítica de mundo para a visão racionalista. Evidentemente, esta transposição se deu de forma gradual, através de um longo processo de análise e adaptação dos povos no decorrer do tempo. Tanto que, entre os séculos XII e VIII a.C. ainda podemos verificar nas epopéias homéricas, o vínculo entre o pensamento humano e a mitologia.

Já no sáculo VI a.C. começa a ocorrer o que seria o marco da transposição deste paradigma, onde o conhecimento deixa de ser considerado um presente dos deuses, para tornar-se uma conquista acessível pela racionalização do homem.

Assim, no período pré-socrático (não por ser referência a todos os filósofos antes de Sócrates e sim por estes filósofos, alguns até posteriores a Sócrates, terem desenvolvido o tema da phýsis) surgem os primeiros filósofos que buscam na natureza, as respostas sobre a origem do mundo - uma vez que as respostas míticas já não eram mais suficientes.

Foram vários os filósofos e várias as suas contribuições para a formação do pensamento atual. Cada um deles foi desenvolvendo sua própria idéia do que seria a phýsis (natureza, processo de nascimento e surgimento de tudo, o que constitui a natureza de um ser, realidade primeira e última de todas as coisas):

Para Tales de Mileto era a água; para Anaximandro de Mileto era o apeíron, o indeterminado; para Anaxímenes de Mileto era o ar e suas variações; para Heráclito de Éfeso o eterno devir, o fluxo, a razão; para os pitagóricos eram os números etc.

Desta maneira, seria necessário um estudo mais aprofundado, bem como um panorama histórico mais completo para entendermos como a racionalização foi se tornando a nova forma de os gregos pensarem o mundo.

Contudo, já temos pistas suficientes para analisarmos quais seriam algumas das implicações mais importantes desta transposição de paradigma para a sociedade atual:

* O homem como medida das coisas: com a racionalização dos mitos, o homem atual - embora continue acreditando em deus/deuses e exercendo cultos míticos, o faz voltado a si. Ou seja, a religião continua sendo um mecanismo de o homem acreditar-se imortal e/ou protegido por divindades. Embora este preceito seja parecido aos do início dos cultos religiosos da humanidade, a mitologia já não exerce a influência de outrora, pois os homens, apesar das regras tidas como divinas, já racionalizam estes dogmas, adaptando-os culturalmente.

*Observação da natureza: embora essa observação já fosse realizada por outros povos, os gregos a qualificaram, formulando hipóteses que posteriormente dariam origem ao que hoje chamamos de biologia, física, cosmologia etc.

*Olhar desacostumado: os pré-socráticos esmiuçaram a realidade que os cercava, questionando as ações e reações físicas, como se nunca as tivessem observado. Isso influenciou todo o ocidente à investigação e procura por evidências, alterando definitivamente a forma de pensar o mundo - o que mais tarde viria a ganhar o nome do Filosofia.

*Mudança de atitude intelectual: por conta da racionalização dos mitos, hoje buscamos uma lógica não só dos fenômenos e da mitologia vigente, como também uma postura crítica a todas as afirmações que absorvemos.

Produzido Por Natachy Petrini - natachy.petrini@hotmail.com

Fontes de pesquisa:
Introdução à História da Filosofia - Marilena Chauí
Edição especial da revista Filosofia: Os Pré-Socráticos
A Filosofia na Era Trágica dos Gregos - Friedrich Nietzsche.

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